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Como as aparições e conversas voluntárias que se registram aos milhões nas redes sociais abertas podem ser organizadas como agências cidadãs de comunicação? Talvez você tenha um perfil em algum serviço de rede social e se não, certamente tem vários amigos que falam deles, publicam ou re-publicam notícias, música ou qualquer coisa que acham que talvez possam te interessar. E se não te interessa, vão compartilhar o que bem entenderem nas diversas redes que participam.
As redes sociais online mudam muitas coisas no jeito como a gente se comunica e também são fontes massivas de histórias pessoais, contos populares, etnografia, antropologia, sociologia, história e outras ciências. A ONU reconhece a relevância dos novos meios e redes sociais como “ferramentas essenciais em diversos aspectos para viabilizar a rápida atualização de jornalistas sobre os acontecimentos e para construir comunidades melhor informadas e coalizões para mudança” (em tradução livre).
No ano passado, lancei uma pesquisa de opinião para aferir o uso, as tendências e costumes relacionados aos serviços de redes sociais online no México, Espanha e Brasil. Este estudo foi parte da tese de doutorado que apresentei na Universidade Autônoma de Barcelona. Os dados delineiam o potencial para a criação de agencias cidadãs de comunicação de alcance mundial e ampla capacidade de representação local, compartilhamento de saberes e de convivências. A criação dessas agências e o tratamento da informação gerada devem considerar as diversidades e as identidades socioculturais como base para a igualdade de oportunidades e de acesso aos novos meios e tecnologias.

Conversas em público

A intenção era sondar como as pessoas se comportam, se aceitam ou não o contato com pessoas desconhecidas e outros aspectos da convivência online em redes. O link para a pesquisa foi divulgado no Twitter, Facebook e Orkut. Quem respondia, convidava os amigos. Parece ser que havia certa curiosidade por também desvendar os hábitos dos conhecidos nesses novos espaços públicos de convivência.
Graças a uma campanha espontânea chegaram 779 respostas de 31 países em duas semanas. Os dados detalham com margem de erro de 6% a 8% os usos, hábitos e comportamentos de cidadãos nacionalizados no México, Espanha e Brasil. Os resultados desenham um cenário “global” de como as pessoas usam o computador, a internet, as redes sociais e os celulares. São nativos ou entendem espanhol.
Os resultados demonstram como as pessoas realmente estão interessadas em se manter atualizadas sobre o que os amigos falam ou publicam em redes sociais.
A pesquisa mediu o uso de 16 tipos de serviços de rede social. Ainda não há definição sobre a quem pertence todo esse patrimônio imaterial e cultural formado pelo conteúdo substancial que as pessoas publicam espontaneamente nessas plataformas da websocial. Os usuários também costumam mudar de serviços. Há certo tipo de moda que determina essa frequência.
Uma maioria que interage e coopera nesses ambientes digitais parece se sentir confortável com relação à privacidade: 67% dos brasileiros, mexicanos e espanhóis dizem manter “total controle sobre o que publicam e sobre o que os outros podem acessar de seus dados pessoais”.
Quando perguntados sobre como consideram suas listas de contatos: 46% dizem que são “meu público e se interessa pelo o que eu comento ou publico”, para 59% são a “família e os amigos” e 58% os reconhecem como “fonte confiável de informação para saber sobre os acontecimentos”. Os dados completos da pesquisa estão disponíveis em espanhol num ebook de acesso livre: http://issuu.com/cesarviana/docs/uab_socialmedia.

Público e Privado

Todo mundo tem alguma coisa a dizer ou para mostrar em público. Por exemplo, numa escola os alunos podem produzir reportagens sobre os colegas que participaram de um campeonato de judô ou sobre as receitas, artesanatos que as mães preparam para vender no bairro. As crianças decidem a linha editorial e podem acessar a informação e aprendem sobre como se preparar para oportunidades nas novas indústrias de mídia que se formam.
O momento facilita o empoderamento como indivíduos, cidadãos, membros de culturas ou comunidades e – quase naturalmente – agentes de mídia.

Ensino de mídia

O ensino de mídia é fundamental para alcançar as condições para se viabilizar agências cidadãs de comunicação. O MediaManual.at é exemplo prático do impacto disso. São os responsáveis pelos materiais didáticos do ensino de mídia desenvolvido em todas as escolas públicas da Áustria. É fundamental que o ensino de mídia e do uso dos novos meios sejam abertos a todos. A organização dos usuários de computadores e celulares como agentes cidadãos de comunicação está relacionada às características e necessidades de cada uma das comunidades participantes.
Há o potencial para estruturar fluxos imensos de informação em agências modularizadas de notícias. Para isso é preciso considerar as redes sociais como fontes abertas e públicas de comunicação. Do mesmo jeito como convivemos nas ruas ou temos acesso à imprensa tradicional. Então, os parâmetros para a formação dessas agencias cidadãs de comunicação se reforçam no ensino de mídia e de novos meios.
Talvez até pareça cedo, mas existem recursos para a coleta de dados sobre as conversações e as comunidades reconhecem as pessoas que publicam informações válidas. Os serviços de redes sociais podem colaborar com isso adotando políticas mais claras de relação com seus usuários.

Mapas abertos

Talvez um dia você esteja navegando por um serviço aberto de visualização de mapas e queira saber sobre o cotidiano de algum bairro do Rio de Janeiro. Você verá as ruas, encontrará líderes de opinião e talvez assista a filmes ou novelas feitas pelos moradores. O que tínhamos eram recursos rudimentares de comunicação, se lembrarmos dos altos custos para transmitir vídeo ao vivo há poucos anos. Mas agora isso é “grátis” por meio de celulares e plataformas web.
Se abre um amplo espectro para a inovação e para o surgimento de diferentes percepções sobre o que as pessoas voluntariamente falam, lêem, comentam, opinam ou recirculam.
Considerando que cada um de nós é um ‘repórter’ em potencial, como a sociedade funcionaria como uma equipe editorial?
Um possível começo seria com a formação de conselhos editoriais cidadãos estruturados por bairros, cidades, estados, países para achar as instruções necessárias para manuais de estilo comunitários, por exemplo.
Existem algumas agências cidadãs, mas a sugestão em tese é a criação de módulos que se integram para formar uma agência completa ou várias. Assim, integrantes de toda escola, bairro, pequena empresa, associação, etc, publicam e acessam informações válidas a partir da colaboração e do compartilhamento de saberes.
As oportunidades de se aprender a lidar com texto, imagética, áudio e/ou audiovisual são inerentes ao desenvolvimento desses “agentes de comunicação”. O acesso às métricas geradas pelos fluxos de audiências e as formas de monetização são pautas para debate em família, nas escolas, nas empresas e demais instituições relacionadas à responsabilidade social.
Há diversas formas de se usar os novos meios para a ações afirmativas e o empoderamento social. Alguns exemplos bem sucedidos disso são: Global Girl Media, Parceiros do Rio de Janeiro, Video Nas Aldeias, IndiosOnline, Fundación Bip-Bip e Ushahidi.

Desenvolvimento coletivo

O desenvolvimento dos sitemas e as especificações dessas agências cidadãs demandam a emulação do planeta e capacidade para emissão e recepção de dados em tempo real. A política editorial e a adoção de maquinário e de software seriam definidas melhor em colaboração coletiva.
A tese aborda o uso de sistemas de redes sociais como meios abertos para a convivência e a interação com disseminação de informação em múltiplos formatos. Os recursos e os meios estão presentes. Chegou a hora de se estabelecer as formas cidadãs de uso. O desenvolvimento do jornalismo de dados caminha em direções parecidas.
Tenhamos em consideração que pouco mais de 25% da população mundial acessa a Internet. Apesar disso, já alcançamos avanços importantes nas aplicações dos novos meios no comércio, na indústria, na educação ou no lazer. Compartilhamos a missão de ainda ver o acesso comum e a liberdade de expressão proporcionadas para as maiorias no planeta. Os celulares causam especial impacto nesse processo por ser o meio com aceitação popular em franca ascensão.
Quais respostas encontramos entre crianças, pais e professores para os preceitos a ser compartilhados por esses novos agentes de mídia? Como se encaixam os “prosumidores” nos fluxos que ampliam e diversificam o mercado das comunicações nos próximos anos? A visibilidade e a capacidade de participação nesses contextos digitais também estão diretamente relacionadas à inclusão social e ao empreendedorismo.
Quem já acessa internet tem oportunidade de se comunicar em âmbito local e/ou mundial em tempo real. Continuaremos neste mesmo caminho, mas cabe encontrar em conjunto as dinâmicas e os usos que mais nos representam enquanto se desenham os próximos passos da engenharia e da convivência aberta via Internet.

César Viana é jornalista pela UFJF e doutor em comunicação audiovisual e publicidade pela Universidade Autônoma de Barcelona. Twitter.com/cesarviana.

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